terça-feira, 16 de novembro de 2010

UNIVERSIDADE FEDERAL DO ESPÍRITO SANTO
ESPECIALIZAÇÃO EM FILOSOFIA E PSICANÁLISE











ALAICIO GERALDO GONÇALVES













RELIGIÃO EM UMA VISÃO PSICANALÍTICA DE FREUD















ALEGRE
2010
ALAICIO GERALDO GONÇALVES












RELIGIÃO EM UMA VISÃO PSICANALÍTICA DE FREUD







Trabalho desenvolvido como requisito básico para nota final da disciplina “Freud como teórico da modernidade bloqueada” com o professor Vladimir Safatle, do curso de Especialização em Filosofia e Psicanálise, da Universidade Federal do Espírito Santo, na modalidade EAD.











ALEGRE
2010
SUMÁRIO

1. Introdução........................................................................... 01
2. Desenvolvimento................................................................. 02
3. Conclusão............................................................................ 07






































1 Introdução

Freud, fundador da psicanálise, ciência ou área do conhecimento, que investiga o ser humano a partir de uma instância constitutiva do mesmo e que até então tinha sido um verdadeiro enigma para o conhecimento humano: o inconsciente. Partindo de um objetivo clínico – a investigação sobre a histeria, Freud foi construindo um vasto arcabouço teórico com sólidas fundamentações empíricas, o qual viria a causar grande impacto nas mais diversas áreas do conhecimento, provocando com a criação da psicanálise, uma inquietante polêmica, que mesmo cem anos depois, ainda consegue ser um sério incômodo à moral, à religião e a cultura.






















2 Desenvolvimento

Freud em seu livro “O Futuro de Uma Ilusão”, desenvolveu um ensaio em fundamentos psicanalíticos frente à questão da necessidade da religião para o homem e toda sua civilização. O pai da psicanálise descreve a religião como uma necessidade humana que se vincula ao estado infantil de desamparo e à nostalgia do pai suscitado por tal necessidade. O Deus justo e a natureza benevolente são as mais nobres sublimações de nosso complexo paternal, pois, o homem, na impossibilidade de imaginar um mundo sem pais, cria falsificações da imagem do universo no qual se sente desprotegido. O anseio pela proteção de um pai supra-sumo (Deus) é uma função que visa exorcizar os terrores da natureza, amenizar as dores humanas frente ao tenaz destino (medo da morte, etc.) e compensá-lo das privações e sofrimentos que são impostos pelo mundo civilizado. Sinais que demonstram que a religião reside na necessidade mais intensa do ser humano – a proteção de um pai. Porém, o anti-humanista europeu deduziu que toda esta ilusão religiosa estaria destinada ao abandono. Pois, futuramente, a civilização seria capaz de renunciar todas as ilusões, substituindo-as por outro corpo doutrinário (a ciência). Esta expectativa partia do pressuposto de que os homens seriam capazes de tornarem suas existências mais toleráveis na terra; porque a religião possui apenas valor sentimental, é incapaz de correções, é provinda de um delírio humano e que esta neurose da infância poderia muito bem ser superada pela humanidade. A religião já era uma causa perdida da sociedade. Neste contexto, a primazia do intelecto (a ciência) atenderia os desejos humanos que lhe atormentam e estabeleceria no próprio homem os objetivos que antes eram realizados na crença de um deus. O desenvolvimento das concepções científicas alcançaria um maior grau de conhecimento do mundo, o que melhor organizaria a vida humana. Pois a ciência já alcançou importantes conquistas para a sociedade e suas concepções estão constantemente se adaptando ao mundo (contrariando os dogmas religiosos). Por fim, Freud argumenta que o papel da ciência é demonstrar o mundo como ele é ao homem e que não haveria mais necessidade de interpretar a vida humana através de abstrações vazias – as religiões.
Freud define a fonte da religiosidade como sendo um sentimento de eternidade, um sentimento de algo ilimitado sem fronteiras, ou sentimento oceânico, que alguns seres humanos experimentam, Freud dá início ao seu famoso ensaio apresentando o conceito de eu na psicanálise. Ele tenta investigar, através da psicanálise, as causas e origens deste ‘sentimento oceânico’. E é utilizando suas teorias sobre o Eu que ele apresenta uma versão para aquilo que se dizia como fonte da religião.
O Eu nos aparece como algo autônomo e unitário, distintamente demarcado de tudo o mais. Ser essa aparência enganadora – apesar de que, pelo contrário, o Eu seja continuado para dentro, sem qualquer delimitação nítida, por uma entidade mental inconsciente que designamos como id, à qual o Eu serve como uma espécie de fachada, configurou uma descoberta efetuada pela primeira vez através da pesquisa psicanalítica, que, de resto, ainda deve ter muito mais a nos dizer sobre o relacionamento do Eu com o id. No sentido do exterior, porém, o Eu, de qualquer modo, parece manter linhas de demarcação bem claras e nítidas.
Freud apresenta, de forma sucinta, que existe uma ilusão sobre aquilo que o ser humano tinha durante séculos de civilização imaginando como de inquestionável certeza, o seu próprio eu. A descoberta de uma instância inconsciente na estrutura do indivíduo humano, representa a quebra da ilusão do predomínio universal da razão humana ou, na melhor das hipóteses, que esta é centrada em bases sólidas como se imaginava. Com relação ao mundo exterior, apesar de aparentemente o Eu ‘manter linhas de demarcação bem claras e nítidas’, Freud demonstra que esta demarcação não é tão clara assim. Há somente um estado – indiscutivelmente fora do comum, embora não possa ser estigmatizado como patológico, em que ele (o Eu) não se apresenta assim. No auge do sentimento de amor, a fronteira entre Eu e o objeto ameaça desaparecer. Apesar de reconhecer que tais fronteiras são rompidas por uma ação causal (o amor), ele demonstra que estados patológicos são capazes de romper esta barreira entre o Eu e o objeto.
Há casos em que partes do próprio corpo de uma pessoa, inclusive partes de sua própria vida mental – suas percepções, pensamentos e sentimentos – lhe parecem estranhos e como não pertencentes ao seu Eu. Há outros casos em que a pessoa atribui ao mundo externo coisas que claramente se originam em seu próprio Eu e por este deixam de ser reconhecidos.
Fazendo uma descrição resumida – já confirmada em outras obras -, de suas descobertas Freud descreve como se desenvolve o Eu em um ser humano. Quando a criança é recém – nascida, esta ainda é incapaz de distinguir o seu eu do mundo externo, este mundo como fonte de sensações que fluem sobre ela. O primeiro momento em que o Eu é contrastado com um objeto é quando este descobre que uma fonte vital de prazer lhe é subtraída, só reaparecendo quando grita. Esta fonte é o seio da mãe; na realidade, o primeiro objeto que diz existir algo externo a ele. A outra função importante que forja o Eu, forçando-o a separar-se da ‘massa geral de sensações’, é o confronto, com as inevitáveis sensações de sofrimento e desprazer. Surge então, uma tendência a isolar do Eu tudo o que pode tornar-se fonte de tal desprazer, a lançá-lo para fora e criar um puro Eu em busca do prazer, que sofre o confronto com um exterior estranho e ameaçador.
É através desta luta do homem com o seu mundo exterior que começa a se diferenciar o Eu do mundo externo, começando o ser humano a introduzir o ‘princípio de realidade’ é, no seu confronto com o princípio do prazer, capacitar o ser humano a construir defesas que o protejam dos desprazeres de que o mundo externo o ameaça.
Descrevendo a estruturação de Eu do ser humano, Freud identifica nesta relação do Eu com os objetos existentes no mundo externo, principalmente com sensações que estes objetos causam no interior do ser, um importante ponto de partida de distúrbios patológicos. Para Freud, portanto, o sentimento religioso estaria fundado não em uma impressão que transcende o homem, que liga misticamente ao universo, e que o ajuda a aceitar a intempéries da vida. Este sentimento seria apenas uma reprodução, em escala menor, daquilo que o ser humano foi na sua origem, um ser ilimitado em suas relações com o mundo, uma vez que quem estabelece este limite, ou a falta dele, é o Eu, nesta fase ainda embrionária e difusa da formação do sujeito. É portanto, com seu pensamento voltado para a revolucionária concepção do Eu, desenvolvida na psicanálise, tomando como provocação a questão da religião, que Freud inicia o seu principal ensaio sobre a civilização e a humanidade. Esta concepção de Eu e sua relação com o mundo (tanto externo com interno), na qual a psicanálise demonstra que todas as barreiras podem ser derrubadas, - uma vez que o Eu se constitui estruturalmente nas suas relações libidinais de objeto -, vem causar sérias implicações no campo da filosofia, tendo sido tal descoberta classificada por Lacan como uma revolução de dimensões copernicianas, tamanho o impacto sobre o pensamento humano que esta viria a causar.
O pai morto torna-se mais poderoso do que em vida. Das sociedades totêmicas a humanidade evolui para sociedades com religiões mais elaboradas, porém essencialmente fundadas na figura mítica de um pai poderoso. Deus, o pai absoluto. Poder e Religião se fundem no seu necessário jogo de dominação social, sendo o Estado moderno, apesar de representar um importante salto de qualidade sobre a religião, o legítimo herdeiro de parte desta forma de poder, que vem acompanhando o homem em todo o seu processo civilizatório.
O custo do processo civilizatório, portanto, é o sofrimento do dar-se conta necessariamente de todos eles. Dependendo da intensidade e freqüência do mal-estar gerado por sentimentos como angústia, ansiedade, depressão e outros, estados psíquicos comuns podem tornar-se psicopatológicos. “A tarefa de evitar o sofrimento pelo ego à satisfação de seus desejos, ao encontrar a interdição do mundo externo, é reinvestida na busca de medidas paliativas e construções auxiliares, tais como extrair luz da própria desgraça, pela religião; satisfações substitutivas, como a sublimação oferecida pela arte; e o uso de substâncias tóxicas, que dão acesso a um mundo fantástico e prazeroso, em lugar do mal-estar provocado pelo princípio de realidade. Neste último caso, as substâncias químicas podem ser produzidas pelo nosso próprio corpo, gerando estados patológicos como a mania, semelhantes aos provocados pelo uso de produtos químicos. Portanto... A civilização é um delírio ao qual aderimos involuntariamente ao nascermos. Portanto, somos constituídos pelos fragmentos dos outros. Quem somos nós, de verdade? O que é a verdade, o que é real, palavras e conceitos criados pelo processo civilizatório, que assim se legitima? Por que tentamos então, nos curar do incurável?
O pai morto torna-se mais poderoso do que em vida. Das sociedades totêmicas a humanidade evolui para sociedades com religiões mais elaboradas, porém essencialmente fundadas na figura mítica de um pai poderoso. Poder e Religião se fundem no seu necessário jogo de dominação social, sendo o Estado moderno, apesar de representar um importante salto de qualidade sobre a religião, o legítimo herdeiro de parte desta forma de poder, que vem acompanhando o homem em todo o seu processo civilizatório.
3 Conclusão

A força do pensamento freudiano, não só está centrada nas importantes descobertas da psicanálise, a qual se impôs como importante área do conhecimento, revelando a natureza humana com as suas fragilidades, mas também possibilitando a descoberta das suas potencialidades. Ela reside também possibilitando a descoberta das suas potencialidades. Ela reside também na enorme capacidade intelectual de não se deixar aprisionar pelo conhecimento e a moral vigente da época. Freud, qual ousado caminhante desbravou fronteiras, enfrentou batalhas, sofreu obstinadamente o peso da caminhada solitária e da incompreensão dos seus pares. Com suas obras ele abriu um enorme horizonte, produzindo um saber literário e inquietude sobre a condição humana, apontou caminhos nunca antes imaginados, jogou luzes onde antes reinavam apenas as trevas e a ignorância. A diversidade, a abrangência e a profundidade das suas descobertas, continuam até hoje demandando uma incessante e heterogênea produção intelectual sobre a condição humana.

Referências:

FREUD, S. “O Futuro de Uma Ilusão”.
FREUD, S. “O Mal-Estar na Civilização”, Texto escrito em 1929 e publicado em 1930
SAFATLE, Vladimir. Freud como teórico da modernidade bloqueada/ Vadimir Safatle – Vitória: Universidade Federal do Espírito Santo, Núcleo de Educação Aberta à Distância, 2010.

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